terça-feira, 28 de fevereiro de 2006

Olha a Belinha aqui, gente!

Eis que chega a hora do retorno. É preciso deixar pra trás a praia maravilhosa, os amigos novos e velhos, aquele clima envolvente, descontraído e quente da Bahia, a falta de horários e de compromissos e rumar ao Planalto Central. Vôo relativamente calmo, filho dormindo no meu colo. E não fosse por um comissário de vôo paulistano estressado e mal educado, teria sido ainda melhor. Mas desembarco em Brasília num céu cinza, sem sol, muito vento, aos 22º Celsius.

Depois de 10 dias de muito sol, muita água salgada e molequeira, mesmo que não tenha feito esforços pra matutar, no meio de tanta calmaria, a cabeça acostumada ao ritmo do ano inteiro terminou processando alguns quesitos que estavam pendentes por conta própria. E tomo uns choques nessa volta. O mais evidente deles fica por conta do mau humor e das caras fechadas em contraposição ao sorriso constante dos baianos. Depois, o excesso de protocolo, de distanciamento que se impõe aqui. Coisa de maluco pra um povo que no primeiro contato trata logo de lhe deixar confortável. E em seguida vem a questão do excesso de memórias que um lugar como aquele carrega, mesmo que se faça uma conta básica e fique claro que ali eu provavelmente não tenha passado sequer ¼ da minha vida. Veio a pergunta: como eu posso ter vivido ali tanta coisa em tão pouco tempo?

Pode ter sido a inconseqüência da adolescência, com a sede de descoberta que ela traz. Pode ter sido o lugar onde, por acaso, algumas pessoas de pontos diversos se encontraram. Pode ser que pelo espírito desarmado, em férias, eu estivesse mesmo disposta a viver sem limites. Mas o fato é que naquela terra eu vivi coisas maravilhosas que se mostraram registradas em muitos lugares e vivas, apesar do tempo.

Pra que servem tantas lembranças?
Aliás, como me perguntou recentemente alguém muito, muito querido: Pra que serve tanto sentimento?

Eu vejo serventia em coisas mais práticas, não havia me questionado nunca acerca da utilidade do amor e da amizade. Mas tem coisa mesmo que se impõe. Entonces, vamos lá.

Tenho amigos pra me salvar da corrente do comum e do razoável e que me empurram pra um lugar nem sempre quente e acolhedor, mas eles sempre me oferecem a possibilidade de que um dia assim será. E lá vou eu pela mão deles, buscando ver o não tão óbvio, avaliando o que está claro, me espantando com o grosseiro, me indignando com o injusto, me deliciando com seus cuidados e preocupações, me encantando com o espetáculo cotidiano da natureza dos homens e das coisas, mas buscando sempre o não-lugar comum. Com o raro prazer de identificar ali pessoas que me explicam e me confundem pelo meu bem, que me facilitam e me complicam, que se pudessem mastigariam pra eu engolir e em outras situações, colocariam, se pudessem, um enorme abismo ou uma gigantesca montanha pra eu transpor. E talvez a serventia dessas pessoas na minha vida seja fazer com que eu viva sem jamais deixar de prestar atenção. Que eu vença, passe adiante, alcance o degrau acima, dê um passinho a mais, mas nunca pelo caminho do mais fácil, mas pelo caminho que eu tenha escolhido, sempre com o apoio, mas nem sempre com a aprovação deles.

Já o amor, eu não encontro outra serventia pra ele que não seja o de me humanizar e me fazer ver que nunca, em lugar nenhum, haverá alguém maior ou menor, diferente, melhor ou pior do que eu. Pra mim o amor só me faz ver que somos todos absolutamente iguais. E se eu amo alguém mais do que outro alguém, eu me espanto, mas sei dar por isso muito bem. Já que esse alguém tão amado deve merecer o seu quinhão a mais de amor meu. E mesmo quando um destinatário do meu amor não faz por merecê-lo, eu sei que ali está a grande provação. Ali está o teste final do meu amor por aquela criatura que pode a partir dali continuar recebendo o que eu sempre destinei a ela ou apenas terá guardado em mim o que ele mereceria receber, mas não sabe administrar. O que só me mostra mais uma vez que somos todos iguais em sabedorias e bestagens: uns sabem administrar dinheiro muito bem, mas não dão conta com o amor, e outros sabem administrar amigos, admiradores, amantes e amados, mas não fazem um ó com um copo na administração dos seus bens.

Eu só me reservo o direito de entregar a quem sabe administrar bem o meu capital de amor e quem não sabe, mas de alguma forma o merece, um dia saberá que ele só ficou guardado, estanque, como diria meu Chiquinho lindinho “O amor não tem pressa/Ele pode esperar/Em silêncio/Num fundo de armário/Na posta-restante/Milênios, milênios no ar.”

ps: isso não significa que eu não me revolte, não chore, não morra de raiva da criatura inapta, na hora do vamos ver, mas depois passa. Eu sou uma lesma! hahahaha

Bom, meus queridos, voltei!
Nigrinha, cheia de “enégia”e mooorta de saudade de vocês.

Depois eu posto o que eu escrevi lá em Moreré. Aliás, eu indico fooortemente aquele lugar. Não deixem de ir se tiverem a oportunidade!

Ah! E pra quem leu, como eu, a autobiografia da Danuza Leão, não deixe de ler “Minha razão de viver – memórias de um repórter” de Samuel Weiner. Digamos apenas que é o contraponto histórico-político que falta pro livro dela.