sexta-feira, 21 de julho de 2006

O dia depois da noite (dãããã, mas é!)

Acordei ao som de Zé da Velha e Silvério Pontes!
Nada como o dia depois da noite, né mesmo?

E nada como receber, logo cedo, um poeminha de alguém que lembrou de vc quando leu.



ARADO
Arado
cultivadeira
rompe veios, morde chão
ai uns olhos afiados
rasgando meu coração.

Arado
dentes enxadas
lavancando capoeiras
Mil prometimentos, juras
faladas, reverdadeiras?

Arado
ara picoteira
sega relha amanhamento,
me desata desse amor
ternura torturamento.

Zila Mamede, in O Arado, de 1959.


Esse livro tem prefácio de Luis da Câmara Cascudo, que começa assim: "Todos os poemas nasceram no chão sagrado, com chuva do Céu e suor dos rostos vigilantes(...)".

Êta coisa linda, benzadeus!

Zila nasceu em 1928, em Nova Palmeira, Paraíba, onde viveu “até cinco ou seis anos de idade” indo ao roçado do avô “comer melancia, tomate, cereja, um tomate pequeno que brotava no mato”. A família de seu pai era de Caicó, Rio Grande do Norte; o avô materno, de Jardim do Seridó, também no Rio Grande do Norte. “Por coincidência, todos foram morar em Picuí, Nova Palmeira e Pedra Lavrada”. As famílias se encontraram em Nova Palmeira, onde ela nasceu. Ainda pequena, muda com a família para Currais Novos (RN), onde o pai monta uma máquina beneficiadora de algodão. Menina do sertão, o mar viria a ser uma forte presença em sua poesia. A primeira vez que o viu foi por volta dos doze ou treze anos, aquela coisa “balançando de um lado para o outro, uma coisa que eu jamais havia visto”:
“- Meu pai, isso é o mar?
Ele disse:Não. Isso é um canavial”.
Estavam em um Ford 39, a caminho de Recife, onde ela finalmente veria o mar.

E ela fala dela mesma assim:

“É o chão onde nasci, e eu gostaria que ela (Nova Palmeira) fosse no Rio Grande do Norte, porque me sinto tão norte-riograndense, que tenho susto quando olho a minha carteira de identidade. Nisso não há nenhum preconceito contra a Paraíba. Apenas fui transplantada muito pequena, a tempo de me sentir enraizada no Rio Grande do Norte. Daí porque eu digo que gostaria que Nova Palmeira, a vila fundada pelo meu avô e pelo meu padrinho de batismo, fosse no Rio Grande do Norte. Era uma fazenda, uma vila, hoje é mais um município brasileiro, mas não é como município, e sim, como sítio do meu avô que permanece na minha geografia sentimental”.

A Universidade Federal do Rio Grande do Norte deu o nome dela à Biblioteca...merecidamente.